Aniversário de São Paulo – curiosidades sobre símbolos da cidade

A cidade de São Paulo foi fundada em 25 de janeiro de 1554, mas só teve um brasão e uma bandeira para representá-la no século XX. Para comemorar os 467 anos da capital paulista, recebemos um artigo do geógrafo Tiago José Berg, autor de Hinos de todos os países do mundo e Bandeiras de todos os países do mundo.

Brasão da cidade de São Paulo

Em dezembro de 1915, a Câmara Municipal de São Paulo instituiu um concurso para a escolha do brasão de armas da cidade, atendendo uma solicitação do prefeito Washington Luís. Até então, o emblema usado pela prefeitura era o brasão da República Brasileira. Formou-se uma comissão composta de personagens da vida cultural paulistana para julgar os trinta e seis concorrentes. Nenhum dos trabalhos satisfez o júri. Pouco se sabe sobre os desenhos, mas havia muitos brasões cheios de águias, bandeiras, fortalezas, correntes partidas e até capacetes de Mercúrio. O projeto de número 32, de autoria do ilustrador José Wasth Rodrigues foi de grande importância no primeiro concurso – introduziu o lema NON DUCOR DUCO (não sou conduzido, conduzo), que se imortalizaria mais tarde como lema heráldico paulistano. Houve um segundo concurso com trinta e dois trabalhos. Nele, sagrou-se vencedor o projeto de número 7, de autoria do poeta e heraldista Guilherme de Almeida, em parceria com Wasth Rodrigues.

Em relação ao modelo atual, o desenho contava com um braço armado empunhando uma espada batalhante, que partia da direita do escudo (destra), com uma coroa mural revestida de ouro e três torres, além do lema escrito em negro. A comissão sugeriu algumas modificações, como a retirada da espada e as letras do mote passaram a ser escritas em vermelho. O projeto foi aprovado por Washington Luís no ato n.º 1.057, em 8 de março de 1917.

Em 2 de outubro de 1974, promulgou-se a lei n.º 8.129, que alterou o seu desenho original para a versão usada até hoje. Foi sugerido um novo posicionamento do braço armado, agora saindo do flanco esquerdo do escudo, para dar a ideia de ação na figura, que também se tornou maior. A coroa mural passou a ter cinco torres – trata-se de um castelo localizado na parte superior dos brasões municipais. São as muralhas que cercavam as antigas cidades medievais. Essa tradição é vem de Portugal, onde há uma regra: três torres para aldeia, quatro para vila ou distrito e cinco para município. Além disso, só a capital pode ter as muralhas em ouro, os outros municípios usam em prata ou cinza.

Bandeira da cidade de São Paulo

A primeira bandeira da capital paulista era toda branca, com o brasão da cidade ao centro. Esse desenho foi sugerido pelo publicitário Caio de Alcântara Machado para ser hasteado na Feira Industrial Têxtil de 1958. A partir de então, a prefeitura resolveu adotá-lo.

Em 1986, o prefeito Jânio Quadros organizou uma comissão para elaborar uma nova bandeira. Usado até hoje, o desenho de Lauro Ribeiro Escobar é formado por um campo branco, onde está inserida uma cruz da Ordem de Cristo de braços alargados ao estilo escandinavo. A cor é vermelha vazada de branco.

No cruzamento dos braços da cruz foi posto um círculo, nas mesmas cores, que ostenta o brasão de armas do município. A cor branca simboliza a paz, a pureza, a verdade, a integridade, a amizade e a síntese das raças. O vermelho é a cor-símbolo da audácia, da coragem, do valor, da galhardia, da generosidade e da honra. A cruz evoca a fundação da cidade pelos padres Manuel da Nóbrega e José de Anchieta. Lembra também a herança da colonização portuguesa e a ação desbravadora dos bandeirantes em busca de novas conquistas.

O círculo é o emblema da eternidade, além de simbolizar que todas as decisões saem e convergem para ele, pois a cidade é centro de poder e capital do “estado bandeirante”. A atual bandeira foi instituída pela lei nº 10.260, de 6 de março de 1987, e hasteada pela primeira vez no dia 18 daquele mês, em cerimônia realizada no parque do Ibirapuera.

Tiago Berg

O sabe-tudo de hinos e bandeiras do mundo inteiro

No dia 3 de julho de 1998, a seleção brasileira venceu a Dinamarca por 3 X 2 pelas Quartas de Final da Copa da França. Tiago José Berg tinha 14 anos, estava na 8ª série e vivia ainda em sua cidade natal, Cordeirópolis, a 164 quilômetros de São Paulo. Ele estava encantado. Apesar de o Brasil perder a final para os anfitriões, foi a Copa mais importante da sua vida. Foi quando TV Globo começou a exibir traduções de hinos nacionais tocados antes dos jogos.

“O hino dinamarquês fala que o país é a sala de Freya. Mas quem é ela?”. Tiago pesquisou e descobriu que se trata da deusa nórdica da fertilidade. Também soube que a Dinamarca definiu seu nacionalismo entre os séculos XVIII e XIX, quando houve um festival de música para escolher o hino. Uma canção estudantil se tornou muito popular e acabou vencedora.

Curioso, ele decidiu buscar hinos, bandeiras e brasões. Contou com a ajuda dos pais para escrever cartas a embaixadas de outros países. Também pedia para a mãe gravar as aberturas dos jogos em fita cassete e avisava: “Quero só os hinos, não precisa gravar o jogo”.

Conforme contatava as embaixadas, ele recebia diversos materiais, como bandeiras, partituras de hinos e cartões com fotos de líderes políticos – “Tenho um do casal que é dono de Lichtenstein. É curioso, Luxemburgo e Arábia Saudita também são países com famílias que os fundaram ou são praticamente donas”. No processo, acabou recebendo endereços de outras embaixadas e passou a conversar com entidades esportivas. Do Comitê Olímpico Internacional, veio um guia com endereços de representações oficiais que os países têm ao redor do mundo.

Logo foi buscar embaixadas fora do Brasil. “Aqui não tinha um representante da Namíbia, por exemplo, mas tinha em Washington.” Para escrever textos em outros idiomas, ainda na virada do século, ele juntou dinheiro e comprou um programa de computador que fazia traduções. Desses lugares, também recebeu materiais, todos guardados com cuidado até hoje. “Antes da internet, eu usava isso como garantia do meu trabalho”, revela.

Ao terminar a escola, pôde unir a paixão às possibilidades que a vida oferecia. Sem dinheiro para estudar em uma cidade distante, cursou Geografia na Unesp da vizinha Rio Claro. Com 12 quilômetros entre sua casa e a universidade, ia e voltava todos os dias. Lá, também fez mestrado e doutorado, sempre estudando símbolos nacionais. Hoje, é professor do Instituto Federal de São Paulo, no campus Capivari. É casado e mora em Piracicaba, a principal cidade da região.

Tiago publicou com a Panda Books os livros Hinos de todos os países do mundo (2008) e Bandeiras de todos os países do mundo (2013). Dois anos após o primeiro chegar às livrarias, recebeu um convite de Jô Soares para ir ao Programa do Jô. Com pouco mais de 20 mil habitantes, Cordeirópolis madrugou para assistir. Segundo ele, em cidades pequenas no interior ainda há mais resistência quando alguém tenta fazer algo diferente: “a entrevista foi boa porque mudou a percepção que as pessoas têm do meu trabalho”. Em 2011, o autor foi homenageado pela Câmara Municipal de Cordeirópolis com o Diploma de Gratidão do Município.

Além das informações completas, seus livros utilizam formatos originais. Bandeiras de todos os países do mundo lembra um álbum de figurinhas e traz não só os modelos atuais, mas também versões históricas utilizadas no passado.

Tiago sempre tem espaço para mais curiosidade. Durante a pesquisa com hinos, criou interesse pela vexilologia, o estudo das bandeiras. Ele participou de um congresso mundial sobre o assunto pela primeira vez em 2013, na cidade de Roterdã, Holanda. Lá, apresentou reflexões sobre bandeiras e paisagens. Ficou em uma mesa com representantes de Rússia, China e Índia – “Era um encontro do BRICS!”.

Em 2017, Tiago conseguiu participar pela segunda vez do Congresso de Vexilologia, agora em Londres, Inglaterra. Conheceu representantes da Geórgia e foi fazer amizade: “Perguntei se o nome do país em georgiano é Sakartvelo”. Ao receber uma resposta positiva, o autor cantou o Hino da Geórgia para os novos amigos. “Ficaram emocionados e me deram a bandeira deles de presente”. Na ocasião, também conheceu o autor polonês Alfred Znamierowski, que inspirou seu livro sobre bandeiras.

Durante o congresso, Tiago apresentou um trabalho que faz na escola e foi bem recebido pelos vexilologistas. Como exemplo, ele cita um projeto realizado durante a Copa da Rússia, em 2018. “Nós temos 27 unidades federativas, nos Estados Unidos são 50, na Rússia, 84.” Pediu aos alunos que pesquisassem e fizessem as bandeiras de todas essas regiões. Assim, conheceram melhor a diversidade e a geografia do país, além de desmistificá-lo. O trabalho virou uma exposição na escola, chamada “Bandeiras regionais da Rússia”.

Tiago tem um quadro na Rádio Educativa de Piracicaba, chamado Hinos do Mundo, foi curador de uma exposição sobre bandeiras durante a Copa de 2014 e quer fundar a associação de vexilologia do Brasil e ir para o YouTube com curiosidades relacionadas à geografia. “Por exemplo, em 1971, o Turcomenistão fazia parte da URSS. Foram perfurar um poço de gás por lá, e começou a pegar fogo. Não tinha como apagar e os soviéticos deixaram lá. Pega fogo até hoje.”