Terra da Gente

Por Thaís Pimenta, Terra da Gente


Coendou longicaudatus boliviensis — Foto: João Marcos Rosa

Análises morfológicas, coletas e comparações de DNA foram essenciais para cinco pesquisadores identificarem uma outra espécie de porco-espinho no Brasil. Se trata do Coendou longicaudatus (ouriço-de-cauda-longa). Até então, ele era confundido com seu primo já conhecido, como Coendou prehensilis (ouriço-cacheiro). O animal representa a 11ª espécie brasileira deste grupo.

De acordo com Anderson Feijó, um dos autores do estudo, o novo porco-espinho tem duas subespécies que vivem em áreas distintas do país: no Cerrado e na Amazônia.

"As populações da Amazônia se tratam da subespécie Coendou longicaudatus longicaudatus e as do Cerrado e Pantanal referem-se à subespécie Coendou longicaudatus boliviensis. Até então, acreditava-se que essas subespécies eram da espécie Coendou prehensilis, que tinha ampla distribuição no país.

"Mas ao longo de 10 anos de pesquisa vimos que não. Descobrimos que o verdadeiro Coendou prehensilis, tem uma distribuição bem restrita, ocorre apenas na região de Mata Atlântica do nordeste e é bem diferente dos ouriços dos outros biomas”, explica.

Ainda segundo o especialista, outro resultado importante da pesquisa foi que a espécie que acreditava-se ser restrita à Serra de Baturité, no Ceará – Coendou baturitensis - também ocorre na região leste da Amazônia, nos estados do Maranhão e Pará. "Portanto, temos agora quatro grupos desses ouriços do complexo prehensilis”, conclui.

A recém-descoberta traz uma grande preocupação em relação à ameaça de extinção dessas espécies que não são tão populosas quanto se imaginava. "Se não houver um trabalho de conservação, essa espécie da Mata Atlântica pode ser extinta", finaliza.

Desinformação é a principal ameaça ao ouriço-cacheiro que com frequência é visto perto de centros urbanos — Foto: Nayra Avinte Vieira/VC no TG

Sobre o estudo

O mestre em Zoologia, Fernando Heberson Menezes, liderou a pesquisa. Ele afirma que coletas de sangue, comparações genéticas e a análise da morfologia foram essenciais para chegar ao resultado.

"Quando a gente inicialmente comparou o crânio e a pele dos ouriços de distintas regiões, vimos que esses animais apresentavam uma grande diferença morfológica. A partir daí fizemos um grande esforço para reunir mais evidências. No fim analisamos 280 porcos-espinhos preservados em coleções biológicas do Brasil e Estados Unidos. Foram coletadas também amostras de tecidos e de sangue para análise de DNA visando entender o grau de parentesco entre os ouriços. Como resultado, achamos uma grande diferença genética entre eles", explica o pesquisador Fernando Heberson Menezes.

Coendou prehensilis flagrado na natureza — Foto: Rogério Freire Filho

Espécies podem ser reconhecidas pelos espinhos

A pesquisa também trouxe avanço em relação a comparação entre as espécies. Ao longo do processo, eles perceberam que é possível diferenciar todas as três espécies usando a coloracão dos espinhos.

Pesquisadores diferenciam espécies pelos espinhos — Foto: Fernando Heberson Menezes

Isso é um importante diferencial porque pesquisadores que trabalham em campo podem agora facilmente identificar as espécies, sem a necessidade de coletar os animais. Conheça abaixo algumas espécies de ouriços.

1. Coendou prehensilis


Características: É a menor das três espécies do complexo prehensilis. Ela possui espinhos com três cores na região dorsal média do corpo com comprimento menor que 10 cm e ligeiramente curvados. A cor da base do espinho é amarelada e longa, a região média do espinho é preta e curta, e a região distal do espinho é amarelada-esbranquiçada. Isso dá ao animal uma coloração geral do corpo amarelada claro mesclado com marrom.


Distribuição: Coendou prehensilis está restrito à porção norte da Floresta Atlântica, incluindo os estados de Alagoas, Pernambuco e Paraíba.

"Como era confundido com a espécie que ocorre na Amazônia e Cerrado, acreditava-se que ele fosse um animal comum. Mas agora a sobrevivência do Coendou prehensilis pode estar em risco. Principalmente porque ele ocorre em uma das áreas mais devastadas da Mata Atlântica", afirma Anderson Feijó.

Coenduo prehensilis — Foto: Marco Antônio de Freitas

2. Coendou longicaudatus


Características:
É uma espécie de médio-grande porte, que tem duas subespécies que ocorre em diferentes regiões brasileiras.

A subespécie que ocorre na Amazônia, o Coendou longicaudatus longicaudatus, tem uma coloração geral marrom escura com mescla de branco na região dorsal do corpo. Isso se deve à combinação de espinhos bicolores e tricolores no dorso do animal. Os espinhos tricolores têm a região basal de cor amarela clara, a região média é longa e de cor marrom escura, e a região distal dos espinhos é geralmente esbranquiçada.

Coendou longicaudatus longicaudatus — Foto: Carlos A. Aya

A subespécie que ocorre no Cerrado, o Coendou longicaudatus boliviensis, quase não tem espinhos bicolores na região média dorsal. A região apical dos espinhos tricolores é longa e esbranquiçada. A região média é bem curta e tem uma cor marrom clara. Já a cor da região basal dos espinhos é esbranquiçada. Esses espinhos são longos, maiores que 10 cm, e bem curvados.

Coendou longicaudatus boliviensis é típico da região do Pantanal — Foto: João Marcos Rosa

3. Coendou baturitensis


Características:
É uma espécie de médio-grande porte. A região dorsal é composta por espinhos bicolores e tricolores. Os espinhos tricolores são longos, maiores que 10 cm, e bem curvados. A parte basal do espinho é curta e amarelada, a parte média é marrom clara e bem longa, e a parte distal é curta e esbranquiçada. A coloração geral do corpo é amarronzada com mesclas esbranquiçadas.

Distribuição: Esta espécie ocorre nas Serras de Baturité e Ubajara no Ceará, e na porção leste da Amazônia, com registros no Pará e Maranhão.

Coendou baturitensis — Foto: Fernando Heberson Menezes

O Coendou baturitensis ainda tem uma característica bem interessante. Os filhotes dessa espécie apresentam uma coloração totalmente diferente das outras. Eles possuem uma pelagem e espinhos que variam em tons de cinza claro e branco.

Filhote de Coendou baturitensis é branco — Foto: Giovanna Rodrigues

Os dados são de estudo de pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Estadual do Ceará (UECE) e Universidade Federal da Paraíba (UFPB) publicado em outubro na revista Journal of Zoological Systematics and Evolutionary Research. Os dados são de estudo de pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Estadual do Ceará (UECE) e Universidade Federal da Paraíba (UFPB), publicado em outubro na revista Journal Of Zoological Systematics And Evolutionary Research.

Hábitos e Defesa

Os espinhos dos ouriços se destacam facilmente do corpo e são sua defesa. Quando algum animal tenta atacá-lo, esses espinhos ficam presos na pele do predador, o que faz com que muita gente pense que o ouriço arremessa os espinhos, o que não acontece.

O espécie mais comum e conhecida, o do ouriço-cacheiro, são arborícolas, de hábitos essencialmente noturnos e solitários. O termo 'cacheiro' , de certa forma, resume a sua natureza: cachar, no dicionário, é o mesmo que esconder-se, ocultar-se. Ele costuma prender-se a cipós a até 15 metros de altura.

Espécies se alimentam de folhas e frutas — Foto: Marcio Varchaki/VC no TG

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