Tivemos a oportunidade de conhecer de perto a famosa Surucucu – de origem tupi, a palavra surucucu quer dizer “aquele que dá vários botes”. É a maior cobra peçonhenta das Américas e a segunda maior do mundo (ficando atrás apenas da King Cobra). Em inglês é conhecida como bushmaster (mestre das florestas) que faz referência ao seu habitat natural e posição na cadeia alimentar. Na Bahia essa serpente é muito conhecida como “pico de jaca” referente à textura da sua pele, que possui uma hiperqueratinização lembrando a casca de uma jaca. Diferente da maioria das cobras peçonhentas, nas quais o veneno possui ação ou hemorrágica ou no sistema nervoso central, a Surucucu possui veneno com ação dupla e é capaz de matar um adulto em 30min. Seu bote pode passar de 1,50m de altura e atingir o tórax de um adulto.

No Brasil esses animais são encontrados na Floresta Amazônica e em algumas partes remanescentes de Mata Atlântica, que já teve 93% de sua área destruida. Em uma dessas “ilhas verdes” preservadas se encontra o Núcleo Serra Grande (NSG), serpentário localizado no litoral entre Ilhéus e Itacaré, região conhecida como Costa do Cacau. Fundado pelo médico Rodrigo C. G. Souza há 16 anos atrás, tem o objetivo de auxiliar na preservação da espécie que se encontra vulnerável, um estágio antes de ser considerada em risco de extinção.

Isso está acontecendo por diversos fatores como a perda do seu habitat natural, isolamento dos animais em “ilhas” de Mata Atlântica e não existir troca genética entre as populações, o desequilíbrio ecológico que diminui a disponibilidade de alimento, além de mitos e lendas envolvendo seu comportamento agressivo sendo muito perseguida pela população. No NSG é feito o importante trabalho de conscientização através de visitas a escolas locais, doação de veneno e dados para pesquisas, e é nesse local que conseguiram pela primeira vez a reprodução delas em cativeiro, o que nos dá esperança da conservação desse animal. Eles possuem também importantes protocolos de manejo voltados à nossa segurança, e à saúde e reprodução da espécie.

Camuflagem

Possui hábito noturno e durante o dia costuma ficar escondida em buracos ou embaixo de folhas. Apesar de chegar a 3m de comprimento alimenta-se somente de pequenos animais como ratos e camundongos, de cerca de 220g. Por isso é muito encontrada embaixo de árvores que atraem ratos como Dendê, Jaca e Cacau. Existe a lenda de que ela possui um ferrão na ponta do rabo, mas na verdade se trata de escamas adaptadas que usam para vibrar contra as folhas secas e avisar da sua presença para possíveis ameaças.

Cauda com escamas modificadas

Dentro da espécie (L. muta rhombeata) existem duas variações: a amarela e a conhecida como “apaga fogo” ou “vermelha”, com uma coloração mais escura que a primeira e associada a um comportamento mais agressivo e arisco. Seu nome vem da lenda de que ela ataca o fogo das tochas usadas pelas pessoas para andar na mata durante a noite.

Como um animal de sangue frio (pecilotérmicos), possui peculiaridades comportamentais e sensitivas. Orienta-se basicamente notando diferenças de temperatura pela fosseta loreal, vibrações, e partículas olfativas do ambiente. Para diferenciar uma presa de um predador utiliza o tamanho da área de calor e a temperatura do animal. Como regra geral de fisiologia, quanto maior o animal mais lento o metabolismo e menor a temperatura corporal. Nós, por exemplo, temos uma temperatura menor e um metabolismo mais lento do que a de um rato – sua principal presa. Portanto, somos considerados predadores.

Isso também influencia no tipo de bote que é desferido, se é um bote de defesa ou de ataque. Quando notada a presença de um predador (bote de defesa) exibe um repertório de comportamentos a fim de evitar ao máximo o uso do seu veneno e o gasto de energia com um ataque que não irá resultar em uma refeição.  Entre esses comportamentos ocorrem muitas vezes na sequência: congelar e inflar a parte debaixo do pescoço, começar a bater o rabo contra a vegetação, se encolher e enrolar formando um “duplo S” com o corpo, analisar a ameaça com a língua, levantar um pouco a cabeça e recolher a língua, para então desferir o bote.

Duplo S




Se for apenas defesa ela pica e se recolhe, já no caso de um ataque predatório ela vai em direção à presa para desferir o bote, a segurando por alguns segundos para garantir a ação do veneno. Como são animais pesados e lentos comparados a outras serpentes peçonhentas, não conseguiriam ir atrás da presa rapidamente caso ela não morresse na hora e conseguisse fugir.

Ponto crucial no manejo dessa serpente é não imobilizar a cabeça com gancho ou pinça, como se faz com outras espécies, pois ela gira em torno do próprio corpo e por possuir a articulação do pescoço muito frágil em relação ao seu peso, gera lesões na coluna vertebral que levam a óbito.

E por fim, se você está assustado com a possibilidade de encontrar essa ou outra serpente, uma dica para quem faz trilhas ou trabalha no mato é sempre andar com um cajado de madeira e ir passando no caminho à sua frente, dando a chance de o animal te perceber e fugir. Ele nunca irá atacar se tiver a opção de sair de perto. Caso você se depare com esse ou qualquer outro animal silvestre, não tente pegar, cutucar, assustar, muito menos matar, apenas se afaste e dê a possibilidade do bicho ir embora.

Esperamos que essas informações auxiliem na disseminação de conhecimento e na conscientização das pessoas, pelo respeito a essa e a todas as espécies de animais e seres vivos.

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