“Amo-o mais do que consigo dizer”: como a rainha Vitória pediu ao príncipe Albert em casamento!

Por: Renato Drummond Tapioca Neto

Um dos casais mais famosos de todos os tempos, Vitória I Reino Unido e o príncipe Albert restauraram a imagem e o respeito da família real britânica, numa época em que escândalos privados herdados de reinados anteriores ameaçavam o prestígio da instituição monárquica. Aos 20 anos, em 1839, tanto a rainha quanto o seu consorte firmaram um compromisso que permaneceu sólido e estável até a morte de Albert, vinte anos depois. A partir de então, Vitória se empenhou de todas as formas possíveis em conservar a lembrança do marido, dedicando-lhe monumentos, livros de memórias e até uma biografia encomendada. Enquanto outros regimes caiam e se erguiam no restante da Europa, o casal real era amplamente celebrado na Inglaterra, fama essa que atravessou quase incólume o século XX e chegou ao nosso tempo imortalizada numa grande quantidade de filmes e seriados, dedicados ao romance que marcou o período vitoriano. O conteúdo das cartas trocadas entre eles (mantidas em sua maioria nos Arquivos Reais do Castelo de Windsor) também veio a público, passando-nos a sensação do afeto que nutriam um pelo outro. No final de 1839, Vitória e Albert mantiveram um correio amoroso, enquanto os ajustes para o casamento dos dois eram tomados.

Com efeito, a soberana considerava seu futuro marido, a quem tinha conhecido anos antes numa visita que ele fez ao palácio de Kensington, como bastante “simpático e bem humorado”. No início, ela tinha algum receio quanto à ideia de casamento, por temer perder o comando da casa real para o futuro consorte, conforme confessou ao Primeiro Ministro e mentor, Lord Melbourne. Esse pensamento, porém, se desfez em outubro de 1839, quando a rainha convocou Albert para para um encontro particular, na terça-feira, dia 15 de outubro. O príncipe lhe respondeu com a seguinte carta, na qual falava da saúde de seu irmão, Ernest:

Love letter from Albert

Querida Vitória.

Eu irei até ti exatamente às 12 horas. Quanto a Ernst, ele não deseja ser visto com o tom amarelado do rosto; isso o perturbaria bastante. Embora sua condição continue a ser muito desagradável e de fato embaraçosa para ele, o médico acredita que encontrou indicações que sugerem que sua doença pode, afinal, piorar antes do que se esperava inicialmente. A nova casa certamente também será uma boa influência. Na alegre expectativa do momento de nossa reunião,

Permaneço seu dedicado Albert.

Sexta-feira.

No dia 15, Vitória e Albert se encontraram em particular, conforme o horário combinado. O que aconteceu entre os dois foi descrito mais tarde pela soberana no seu diário: “Disse-lhe imaginar que ele sabia porque eu quis que viesse e que ficaria muito feliz se ele concordasse com o que eu queria (isto é, casar-se comigo); abraçamo-nos várias vezes e ele foi muito gentil, muito afetuoso”. Como Vitória era a rainha, o protocolo regia que o pedido formal de casamento deveria partir dela e não de qualquer um de seus pretendentes. Albert, por sua vez, aceitou o pedido na mesma hora e beijou as mãos de sua noiva várias vezes. “Ah! Sentir que eu era e sou amada por aquele Anjo que era Albert foi um prazer enorme demais para descrever! Ele é a perfeição, a perfeição em todos os aspectos, em beleza, em tudo!”, completou a rainha no seu diário do dia 15. De sua parte, o príncipe lhe escreveu:

Carta de amor de Albert

Minha querida e amada Vitória

Estou tão tocado pela evidência de confiança que você me concede nas suas cartas enviadas, e pelos sentimentos tão afetuosos expressos por meio delas, que eu mal sei como lhe responder.

Como eu ganhei tanto amor e tanta bondade calorosa?

Ainda não consigo me acostumar com a verdade de tudo o que vejo e ouço e só posso acreditar que o Céu enviou um anjo para mim, cujo brilho se destina a iluminar minha vida.

Que eu consiga fazer você tão feliz quanto merece ser !!

Permaneço de corpo e alma, para sempre seu escravo.

Seu devotado,

Albert.

A jovem rainha ficou muito emocionada com as palavras do noivo e com sua demonstração de afeto recíproco. Contudo, seria equivocado dizer que Albert estava apaixonado pela prima àquela altura do campeonato. O mais correto é que ele ficara muito tocado com os sentimentos dela, conforme relatou para sua família por ocasião do pedido de casamento. Romântica por natureza, a ideia de um matrimônio arranjado ou calculado era repugnante para Vitória, por isso ela relutou alguns meses antes de aceitar a corte feita pelo príncipe. Ao tio Leopoldo, rei dos Belgas, a soberana escreveu sobre a aceitação de Albert ao seu pedido e sobre o fato de ele ter que viver ao seu lado na Inglaterra: “amo-o mais do que consigo dizer e farei tudo o que puder para tornar esse sacrifício (pois, em minha opinião, é isso que o é) o menor possível. Ele parece ter grande tato, coisa muito necessária em sua posição”. A rainha ainda disse ao tio que “esses dias passaram como um sonho pra mim, e estou tão aturdida com tudo isso que quase nem consigo escrever; mas realmente me sinto muito feliz”. De fato, as respostas de Vitória às cartas de Albert eram mais curtas e diretas. Quando o convocou para uma reunião privada, por exemplo, ela simplesmente escreveu:

Carta de amor de Victoria

Querido Albert,

Você pode vir a mim sozinho por um momento?

Sua dedicada,

Vitória.

A rainha manteve o pedido de casamento em sigilo pelo máximo de tempo que pôde. Sua mãe, a duquesa viúva de Kent (tia de Albert), só soube da notícia apenas um mês depois, o que a deixou bastante chateada. Naqueles anos, mãe e filha não viviam em bons termos, em decorrência das situações vexatórias impostas a Vitória na adolescência, provocadas pela ambição da duquesa e de seu secretário, Sir John Conroy, antes dela subir ao trono em 1837. Em 9 de novembro de 1839, porém, Vitória contou-lhe tudo. As duas se abraçaram e a duquesa deu sua bênção ao novo casal. O restante da família, entretanto, tomou conhecimento da decisão da soberana bem antes, conforme ficou registrado no bilhete escrito por Vitória no dia 15 de outubro, contendo algumas instruções para Albert:

Carta de amor de Victoria

Querido Anjo,

Leia estas cartas para seu pai, tio Leopoldo e Stockmar e as devolva o mais rápido possível.

Sua dedicada, Vitória

15 de outubro de 1839.

Entre as cartas entregue ao noivo, estava a que a rainha endereçou ao rei dos Belgas, citada em parágrafo anterior. Albert, por sua vez, deu a notícia à sua avó da seguinte forma: “uns dias atrás a rainha me chamou aos seus aposentos e me declarou, numa efusão genuína de amor e afeto, que eu ganhara todo o seu coração e que ficaria extremamente feliz se eu lhe fizesse o sacrifício de dividir a vida com ela, pois falou que via aquilo como um sacrifício”. Segundo o príncipe, Vitória se considerava indigna dele: “a alegre franqueza com que me disse isso me deixou absolutamente encantado e fiquei totalmente arrebatado. Ela é de fato muito boa e simpática, e tenho plena certeza de que o céu não me entregou em más mãos e de que seremos felizes juntos”, completou Albert em sua carta. A jovem noiva também lhe enviava presentes e era toda cheia de atenção:

Carta de amor de Victoria

Querido Anjo,

Estou lhe enviando algo que o divertirá muito.

A educação em Kensington e Claremont é maravilhosa.

Sua dedicada,

Vitória

Segundo a biógrafa Julia Baird, “foi a paixão de Vitória que deu impulso ao casal, mas a devoção mais lenta, porém sólida, de Albert viria logo a seguir” (2018, p. 134). Os noivos se comportavam em público como dois apaixonados. Ele lhe pegava as mãos, fazia carinho nelas e admirava seu pequeno formato e delicadeza. Enquanto a rainha trabalhava, Albert se sentava ao seu lado, ajudando-a com o mata-borrão quando ela precisava secar a tinta. De sua parte, a soberana podia ser vista passando por trás do noivo para lhe dar um beijo de surpresa na testa e vivia correndo atrás dele para um último abraço antes de se despedirem. “Falei a Albert que devíamos ser muito muito íntimos juntos e que ele podia entrar e sair quando quisesse… Ah! Como ficarei feliz em ser muito íntima com ele”, escreveu ela em seu diário. O noivado, porém, seria curto. Em 10 de fevereiro do ano seguinte, a rainha e seu príncipe se casaram numa belíssima cerimônia, que mais tarde foi copiada por muitos outros casamentos ocorridos dentro e fora da família real.

Fontes:

The letters between Queen Victoria and Prince Albert – Acesso em 07 de junho de 2020.

BAIRD, Julia. Vitória, a rainha: a biografia íntima da mulher que comandou um império. Tradução de Denise Bottman. Rio de Janeiro: Objetiva, 2018.

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