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O que é que a pulseira tem?

Cristiano Ronaldo é um dos muitos adeptos. A pulseira do equilíbrio promete o que todos querem – bem-estar
25 de Julho de 2010 às 00:00
O que é que a pulseira tem?
O que é que a pulseira tem?

De pé, com os braços esticados ao nível dos ombros e uma das pernas flectida, qual figura do ‘Homem Vitruviano’ de Leonardo da Vinci, Jorge Paiva, monitor de ginásio de 33 anos, exemplifica o teste de equilíbrio que há cerca de três meses conquistou o seu apreço. Não, não se trata de um anúncio de televendas, embora não lhe falte potencial. “Quando fiz o teste não sabia do que se tratava. Apenas pediram que me colocasse em posição e fizesse força na zona dos ombros. Depois deram-me a Power-Body para a mão e notei logo a diferença. Hoje tenho mais equilíbrio quando faço exercícios com pesos-livres”, afiança o desportista do alto dos seus dezassete anos de treino. Mas afinal que pulseiras são estas que nos últimos meses conquistaram milhares de portugueses com promessas de bem-estar, sem recorrer a anúncios publicitários?

Em Portugal existem pelo menos três marcas – a Power-Body, a Power-Balance e a Infinite –, todas elas baseadas no mesmo fundamento: restituir flexibilidade, resistência, equilíbrio e força ao nosso corpo.

Orlando Russo, sócio-gerente da TribeStation, empresa responsável pela distribuição da Power-Body em Portugal, pulseira que já ultrapassou as seis mil unidades vendidas desde o início do ano, desmistifica o assunto. “A Power-Body, criada no final de 2009 por um cientista da NASA, é uma pulseira de  silicone cirúrgico, anti-alérgico, antibactérico, com dois hologramas quânticos embebidos numa frequência com iões negativos, que, ao estar em contacto com o nosso corpo, estabiliza a nossa frequência. Tem a ver com quântica. Se estivermos em pleno, tudo melhora”.

O negócio não tem dado sinais de cansaço, razão pela qual se acertam os últimos pormenores para a entrada das Power-Body num mercado mais ambicioso. “Assinámos um contrato com um grupo que fará distribuição das pulseiras nas farmácias. Já temos um pedido de Coimbra”. 

Actividade desportiva   

Alberto Chaiça, maratonista, não recorreu à pulseira, comercializada por 35 euros em cerca de cinquenta lojas no País, por motivos de saúde mas porque sentiu que esta era uma ajuda essencial para a sua destreza física. “Depois de fazer os testes sugeridos pela marca, decidi usar a pulseira nos treinos. Com ela melhorei a capacidade de subida e de resistência”, garante o atleta de 36 anos. Já Manuel Martins, médico reformado e desportista por convicção, garante que a flexibilidade foi o efeito mais visível. “Com a pulseira senti uma melhoria na flexibilidade e eventualmente no controlo do stress, quer como atleta, quer como praticante de golfe”. O seu espírito pragmático, herança dos anos em que foi médico do Centro Hospitalar de Lisboa Central, tornaram-no menos permeável às ‘receitas milagrosas’. “Acredito que funcione mas não tenho bases científicas que o possam confirmar. É apenas o que sinto”.

Terão então as ‘pulseiras do equilíbrio’ efeitos benéficos na actividade desportiva? De acordo com Renato Graça, especialista em Medicina Desportiva, “os bons resultados desportivos só se obtém com um bons treinos, treinadores, acompanhamento médico e alimentação adequados. Não há outra fórmula. Com o bem-estar passa-se a mesma coisa: hábitos saudáveis são o melhor remédio”. Como tal, estas pulseiras são mais um dos “produtos milagrosos que aparecem no mercado, como os adesivos no nariz ou os calções térmicos popularizados por Magnusson”.

E quem não se lembra das famosas Tucson de cobre, com duas bolinhas nas extremidades? Dizia-se que aliviavam dores de cabeça e doenças reumáticas e foram popularizadas por uma campanha de rádio e televisão protagonizada por António Sala há duas décadas. “Na altura, as pulseiras Tucson tiveram um êxito estrondoso. Hoje não faria essa publicidade, pois tenho uma outra forma de estar e pensar”, refere. “Cheguei a usá-la duas semanas e a única coisa que ganhei foi uma mossa no vidro do carro por ter batido nele com a pulseira”.

Hoje, as estrelas encartadas são outras. Falamos de ícones do desporto como o do basquetebolista Shaquille O’Neal, do futebolista Cristiano Ronaldo ou  mesmo do piloto de Fórmula 1 Rubens Barrichello, que catapultaram a pulseira Power-Balance, outra das marcas, para o estatuto de ‘produto comprovado’, algo que milhares de fãs não ousam questionar. Em Portugal, a pulseira, disponível por 38 euros em mais de 150 pontos de venda, já foi adquirida por 20 mil pessoas desde Dezembro de 2009. Criada nos Estados Unidos da América para atletas de competição, a pulseira depressa se tornou numa “mais-valia para todos, principalmente para as pessoas mais velhas”, diz Rodrigo Sampaio, um dos responsáveis pelo produto em território nacional. “As Power-Balance têm um holograma com um mineral chamado mylar que contém informação quântica, a qual tem embutida uma frequência que vai reequilibrar a nossa energia, permitindo um maior fluxo sanguíneo, força, equilíbrio e flexibilidade. O organismo começa a ficar certinho”. Porém, “os resultados variam de pessoa para pessoa. Uns dormem melhor, outros têm mais equilíbrio, menos enxaquecas, mais energia ou menor propensão para lesões”, defende Bruno Patrão, outro responsável pela marca.

Desenganem-se aqueles que acreditavam que semelhante produto seria o último grito das curas milagrosas para um sem-fim de maleitas. “A pulseira não está pensada para combater doenças”. Que o diga Alexandre Farrim, gestor de clientes de 29 anos. “Comecei a usar por curiosidade há quase dois meses. Durmo melhor e perco a calma com menos frequência. Para mim funciona para gerir a adrenalina. Acredito que o facto de se acreditar seja determinante. É preciso ter um pouco de fé mas com bom senso: tenho um problema nas costas e não foi a pulseira que o resolveu”, afirma.

Milagre ou fraude? 

A resposta científica a este facto poderá ser mais clara do que eventualmente se possa pensar. Apesar das constantes referências a ‘hologramas quânticos’ e   ‘campos energéticos’, o professor de Física da Universidade de Coimbra, Carlos Fiolhais, alerta para o facto de estes termos serem “uma confusão de palavras que, embora isoladas, possam, nalguns casos, fazer sentido, no seu conjunto não fazem sentido nenhum”. “O termo ‘energia quântica’ não significa nada. Só existem quatro formas de energia ligadas às quatro forças fundamentais que se conhecem: a gravítica, a electromagnética, a nuclear forte e a nuclear fraca. Na teoria quântica – que nos permite entender os constituintes fundamentais da matéria – podem entrar os três últimos tipos de força mas nada disto tem a ver com pulseiras”. Como tal, “do ponto de vista da Física não há nenhuma razão para acreditar nos efeitos”, adianta outro especialista. Um estudo da Universidade Politécnica de Madrid concluiu: “as pulseiras Power-Balance não apresentam nenhum efeito sobre o equilíbrio”.

Perante a ausência de evidências científicas, a sensação de bem-estar ou melhoria da performance poderá ser explicada pelo efeito placebo. “Existem determinadas substâncias ou amuletos que não têm nenhum ingrediente activo mas que ao usarmos e acreditarmos que nos faz bem os resultados serão positivos. É o efeito placebo. A pessoa ainda se sente melhor do que tomando algo que poderia realmente fazer bem”, defende o psicólogo Américo Baptista. Nestes casos, a convergência social pode ser determinante. “Quem não andar com a pulseira e a usar mas não melhorar é considerado bizarro ou anormal”. Afinal, a bem da saúde, a tentação de experimentar é maior.

Vendas

Desde Dezembro do ano passado, a pulseira Power-Balance já foi adquirida por 20 mil portugueses.

Marcas

Em Portugal existem três marcas de ‘pulseiras do equilíbrio’: a Power-Body, Power-Balance e Infinite.

Preços

 A pulseira Power-Balance custa 38 euros. Já a Power-Body  é comercializada  por 35 euros.

Selecção

De regresso a Portugal, vários jogadores da Selecção Nacional usavam as ‘pulseiras do equilíbrio’.

Proibição

No mundo do desporto já há quem defenda a proibição destas pulseiras pelos atletas em competição
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