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“Napoleon”. Pequeno grande homem

“Napoleon” enquadra-se, nas suas linhas gerais, no género épico histórico.

“Napoleon” enquadra-se, nas suas linhas gerais, no género épico histórico.
“Napoleon” enquadra-se, nas suas linhas gerais, no género épico histórico.  © Créditos: DR

A primeira tentativa de contar no cinema a história de Napoleão data do final dos anos 20, quando os filmes ainda eram mudos. Entretanto, várias produções falharam e outras desistiram, sendo a mais famosa a de Stanley Kubrick que morreu sem realizar o maior biopic da sua vida.

É Ridley Scott que, com 86 anos, se lança num luxuoso passeio cinematográfico pelas maiores realizações militares e políticas de Bonaparte, integrando um estudo de personagem entre o heroico, o cómico e o estranho. Apesar de Napoleão ser associado regularmente à sua estatura, nesta obra os autores decidiram não ir por aí, mas as inseguranças do protagonista estão sempre presentes.

Dito isto, “Napoleon” enquadra-se, nas suas linhas gerais, no género épico histórico. O filme abrange várias décadas, desde a ascensão ao poder até aos últimos dias no exílio, dramatizando muitos dos principais momentos da biografia, como se de um artigo da Wikipédia se tratasse.

Só que, com Ridley Scott atrás das câmaras, podemos sempre contar com a exibição das vitórias mais famosas do imperador recriadas numa tela sangrenta e cheia de detalhes. Entre os momentos de comédia de costumes, Scott orquestra panoramas de guerra com fabulosos efeitos especiais. Vemos o tamanho dos exércitos, os danos que as balas de canhão podem causar aos corpos humanos e aos cavalos. Tudo tão tecnicamente impressionante como se poderia esperar de um cineasta de Hollywood que gosta de gastar montes de dinheiro. E se dessas batalhas se pode dizer que não são muito envolventes (o público está na plateia e nunca é levado para as trincheiras), talvez essa seja a abordagem apropriada para retratar um líder que via os seus homens como simples peças da máquina de guerra.

No centro desta lição de história está a atuação de Joaquin Phoenix no papel principal. É ele que tira “Napoleon” do terreno do filme épico de guerra para descrever um tipo estranho, por vezes um verdadeiro banana, mas com um elevado grau de excitação sexual.

Apesar do lado sensual, o filme não se aventura em explicações sobre o amor que Napoleão nutre por Joséphine, ou em saber se ela está apaixonada por ele.

O protagonista torna-se narrador e lê muitas das cartas de adoração de Napoleão para a sua esposa (num subterfúgio narrativo barato), mas nem essas missivas explicam por que razão um homem da sua craveira não se sente digno dela, apesar de ele ter conquistado meio mundo e ela ter dormido com outro meio.

O argumentista, David Scarpa, coloca o público em belas casas senhoriais, mostra centenas de lindos trajes de época e milhares de figurantes vestidos a rigor, mas faltam ideias que expliquem quem é Napoleão, o que ele quer, ou por que razão tem um êxito militar e político tão grande. Tão pouco fica claro porque é que ele está a travar uma determinada batalha ou a assinar um certo tratado, e porque nada disso é óbvio (a não ser que sejamos peritos em História), é difícil preocuparmo-nos com as consequências.

Ridley Scott passa a correr pelos marcos históricos, mas diminui a velocidade e dá tempo ao tempo sempre que a libido do seu herói aumenta. Grande parte do filme acontece à volta do romance com Joséphine. Há um bizarro toque de comédia sexual nas interações do casal. Napoleão tanto se comporta como um miúdo obediente diante da mãe, como um amante adolescente com cio.

Joaquin Phoenix, como sempre, revela a psicologia através do físico. A questão da altura (assim como a da idade) não é central neste filme. Este Napoleão é atrofiado, mas emocionalmente. É um menino a aprender a ser homem.

“Napoleon” de Ridley Scott com Joaquin Phoenix, Vanessa Kirby, Edouard Philipponnat, Youssef Kerkour, Tahar Rahim e Rupert Everett.

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