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Francisco Louçã é o 37.º Mais Poderoso de 2018

O Bloco ganhou força e poder já sem Louçã à frente do leme, mas este acabou por beneficiar disso. O antigo líder de um pequeno partido de extrema-esquerda é hoje uma voz constante na comunicação social e visto como um senador da República.

# Porque Sobe - Francisco Louçã mantém segura a sua posição no 'ranking' dos Mais Poderosos, com uma subida de duas posições que se deve mais a ajustamentos noutros nomes do que a uma ascensão efectiva. O seu poder resulta da união entre a sua influência política e partidária, com o seu poder mediático, bem patente na sua presença na televisão, rádio e imprensa. A actual solução governativa, onde o seu partido é um apoio imprescindível do Governo, reforça o estatuto de senador da esquerda.
Miguel Baltazar
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Com 61 anos, Francisco Louçã é uma história de sucesso improvável na escalada ao poder, passando de líder de um partido tão irreverente quanto irrelevante nos anos 80 e 90 a senador da República em 2018.

Oriundo dos movimentos trotskistas, Louçã começa a surgir mediaticamente nos anos 90 à frente do PSR. Em 1999, funda, em conjunto com Luís Fazenda, Miguel Portas e Fernando Rosas, o Bloco de Esquerda, o único partido que conseguiu impor-se duradouramente no firmamento partidário nascido com a revolução de Abril.

Líder quase incontestado do Bloco durante 13 anos, não foi contudo um líder consensual e enfrentou vários críticos que acabaram por abandonar com estrondo e estragos o seu projecto político. E durante a sua liderança provou também derrotas pesadas, como a que sofreu nas eleições legislativas de 2011, recolhendo apenas 5% dos votos e vendo o seu grupo parlamentar reduzido a oito deputados, menos de metade dos alcançados nas eleições anteriores.

É já visivelmente desgastado que abandona a liderança do partido em 2012, deixando uma sensação de orfandade no seu seio. Substituído por uma mal-sucedida liderança bicéfala, que contou com o seu apoio, entre João Semedo, falecido recentemente, e Catarina Martins, Francisco Louçã manteve uma influência muito grande no partido nos primeiros anos que se seguiram.


Os poderes de Francisco Louçã
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Nos cinco critérios do Negócios para analisar o poder, veja porque ficou Francisco Louçã na 37ª posição na lista dos Mais Poderosos de 2018.

Porém, os bons resultados eleitorais obtidos pelo Bloco de Esquerda debaixo da liderança de Catarina Martins vieram abrir espaço para a afirmação de uma nova geração de dirigentes, onde se destacam Jorge Costa, Pedro Filipe Soares, Marisa Matias, Mariana Mortágua, José Soeiro e José Gusmão, entre outros. E se a direcção do partido não deixa de ouvir Francisco Louçã sobre as grandes questões estratégicas e este não se coíbe de dar as suas opiniões publicamente, a sua influência directa foi diminuindo com a passagem do tempo.

Marcelo foi eleito como um anti-Cavaco. Desde então, tem sido um factor de estabilidade política.

Francisco Louçã
Em entrevista ao Negócios em Agosto de 2016


Agora, é visto como uma espécie de senador da esquerda, para o qual contribuiu a sua nomeação para o Conselho de Estado e a sua presença constante na comunicação social, ao mesmo tempo que mantém uma vasta produção académica.

A ascensão de um senador

Paradoxalmente, é agora, que já não lidera o Bloco, que o partido tem mais poder do que nunca. Louçã usou esse poder para ascender a cargos antes inalcançáveis por membros da sua família política e que reforçam o seu estatuto de senador. Por outro lado, foi alimentando esse poder do Bloco com o espaço mediático que soube conquistar, onde consegue afirmar e difundir ideias que, no fundamental, coincidem com as do seu partido.

Essa é a minha vida. É procurar as alavancas de Arquimedes, onde podemos apoiar a pouca força para fazer muita força.

Na verdade, hoje, o BE prepara ministros. Mariana Mortágua há-de ser ministra das Finanças.

Francisco Louçã
Em entrevista ao Expresso em Janeiro de 2018


Os ventos favoráveis da solução governativa adoptada a seguir às últimas eleições legislativas vieram facilitar esta ascensão. Mesmo sem estar no Governo, o apoio imprescindível do Bloco de Esquerda (em conjunto com o PCP) ao Governo de António Costa permitiu ao partido indicar pessoas para órgãos que antes lhes estavam vedados. Primeiro, sendo nomeado para o Conselho de Estado, que reúne regularmente com o Presidente da República, e depois com a nomeação algo surpreendente para o Conselho Consultivo do Banco de Portugal.

No caso de Robles, que apanhou de surpresa o partido, o comentador deixou algumas críticas ao comportamento do vereador.
No caso de Robles, que apanhou de surpresa o partido, o comentador deixou algumas críticas ao comportamento do vereador. Luís Manuel Neves

Simultaneamente, Louçã foi sabendo gerir e reforçar a sua presença na comunicação social. Além do seu comentário semanal na SIC, o conselheiro conta também com uma coluna semanal no Expresso (e antes disso um blogue alojado no site do Público para onde escrevia muito regularmente com Bagão Félix e Ricardo Cabral) e um comentário matinal sobre a economia na rádio TSF às sextas-feiras.

Influente no partido "ma non troppo"

As suas opiniões são ouvidas com atenção pelo partido. Porém, se algumas vezes parece antecipar as posições do BE, também acontece não ser seguido pela direcção. Isso aconteceu, por exemplo, quando defendeu, a meio da legislatura, que deveria haver um segundo compromisso escrito entre os partidos da geringonça para dar continuidade às primeiras posições conjuntas; e acontece ainda hoje em relação ao euro, com Francisco Louçã a defender a saída de Portugal da moeda única - ao contrário do que antes defendia -, uma posição que não é assumida pelo Bloco.

É preferível uma recomposição do euro, que permita a Portugal ter a sua própria moeda, eventualmente em acordo com a Europa. 

Francisco Louçã
Em entrevista ao Jornal Económico em Janeiro de 2018


Porém, no caso de Ricardo Robles, Louçã pareceu sinalizar uma mudança na posição do Bloco, três dias antes da demissão do autarca. Sem deixar de o defender, o comentador disse que Robles deveria ter tomado antes a decisão de não vender o prédio (e arrendá-lo duradouramente) e que o preço de venda era "excessivo".