Era uma vez uma floresta que, mais do que encantada, consegue sempre fascinar quem a visita. E pode resultar estranho que um convite a uma visita a esta esmeralda incrustada no concelho do Luso comece envolto numa ambiência de fábula. A Mata Nacional do Bussaco é isso mesmo: um museu verde de 105 hectares envolto num conjunto de memórias palpáveis e também audíveis, que ressoam entre seculares troncos, caminhos gastos e paredes esquecidas revestidas a musgo e líquenes. Nascida mata no século XII, hoje é mais floresta graças ao empenho primário dos recatados frades carmelitas descalços da centúria de seiscentos, que instalaram aqui o seu deserto. Foram eles que, ao penetrarem na Floresta Relíquia forrada de singulares adernais (aderno), louriçais (loureiro) e carvalhais (carvalho-alvarinho e carvalho-negral), ali reconheceram um Boscum sacrum, resquício de um paradisíaco Éden de outros tempos.

Volvidos séculos, as árvores que mais abundam são as várias espécies de cedro, das quais se destaca o cedro do Bussaco, reconhecido como o ex-líbris da Mata, mas que na verdade é natural da América Central. Sobressaem ainda monumentais gigantes verdes, como os eucaliptos, as araucárias ou as sequóias e, no vale dos Fetos, impressionantes fetos de porte arbóreo que nos transportam para a paisagem do Jurássico. Este jardim, que alberga mais de 250 espécies de árvores e arbustos, constitui uma das maiores colecções dendrológicas europeias, embora se mostre carente de cuidados continuados. Só assim se poderá travar a invasão progressiva das acácias e o natural envelhecimento de um coberto vegetal, conservando o estatuto de um dos expoentes máximos do arboreto português, a par do Parque e Palácio da Pena.

Mata Nacional do Bussaco

Toda a abundância hídrica que brota das suas seis fontes e alimenta os inclinados regatos que correm pela encosta da serra do Buçaco permite que ocorram aqui 17 espécies de anfíbios, com natural destaque para o endemismo ibérico, a salamandra-lusitânica. Nos seus leitos, podem ser observados o vistoso lagarto-de-água ou as duas inofensivas cobras-de-água, a de colar e a viperina (3 das 14 espécies de répteis que foram documentadas para a Mata). Para os mais atentos, impõe-se o suave restolhar da vegetação, originado pelo sorrateiro passar dos muitos animais que aí encontraram o seu santuário. Das 35 espécies de mamíferos presentes, o destaque popular vai para o arborícola esquilo-vermelho, mas também se encontram abundantes vestígios de javalis, coelhos e muitos micromamíferos.

Graças a esta abundância de alimento, contabilizaram-se oito espécies de carnívoros, como a raposa, com as suas patrulhas diurnas, ou as noctívagas ginetas, escondidas dos olhares indiscretos no alto das copas para onde trepam a cada alvorada. A noite é o claro domínio das 15 espécies de morcegos que, com afã, caçam insectos nocturnos voadores. É claro que os animais mais abundantes são as aves florestais (cerca de 80 espécies), algumas tão afoitas como o melro, outras mais tímidas como a estrelinha-de-cabeça-listada e algumas ainda capazes de prestar verdadeiros serviços à regeneração do ecossistema florestal, como os gaios, que constituem despensas de bolotas enterradas para sobreviver ao Inverno e acabam por plantar novos carvalhos.

Mata Nacional do Bussaco

A floresta de crescimento antigo do Bussaco encanta viajantes de todas as idades.

Não é, pois, de admirar que este lugar, tolhido entre monoculturas de pinheiro e eucalipto, constitua um ponto de romaria obrigatória. Apesar das muitas transformações e de um certo desleixo nos cuidados, os seus valores conseguem ainda enfeitiçar e responder subtilmente a um diversificado conjunto de interesses: arquitectónicos, históricos, religiosos, militares e culturais, além dos inquestionáveis valores naturais.