Sociedade

Greve climática: “A Greta, sozinha, não consegue mudar nada. Temos mesmo de sair à rua”

28 novembro 2019 13:38

Helena Bento

Helena Bento

Jornalista

Fotografia tirada numa das greves climáticas anteriores, em Lisboa.

nuno fox

À quarta será de vez, ou pelo menos é isso que esperam os jovens que estão a organizar a greve climática marcada para sexta-feira, 29 de novembro, a dias da chegada da ativista sueca Greta Thunberg a Portugal. “Esperamos que a população esteja mais aberta a participar e já não veja isto como algo estranho, que olhe para nós e finalmente perceba que vamos sofrer”, diz ao Expresso a organização

28 novembro 2019 13:38

Helena Bento

Helena Bento

Jornalista

Os objetivos são os mesmos — lutar pela justiça climática, “acabar com os projetos novos de combustíveis fósseis”, “reduzir as emissões” e “mudar o sistema porque já se percebeu que este não é capaz de lidar com todos os problemas que têm surgido” — mas espera-se que haja mais pessoas a lutar por eles. E a lutar especificamente na rua, na sexta-feira, 29 de novembro, dia de mais uma greve climática estudantil em Portugal. Gonçalo Paulo, 22 anos e membro da organização da Greve Climática Global em Portugal, explica que, “sendo a quarta manifestação, espera-se que a população já esteja mais aberta a participar e que já não veja este tipo de iniciativas como algo estranho, que perceba que são importantes e que sair à rua para mostrar o descontentamento face à inação do Governo na questão climática é mesmo necessário”.

Isto porque embora não haja cá em Portugal quem lhes chame “idiotas”, como o apresentador de televisão britânico Jeremy Clarkson chamou à ativista sueca Greta Thunberg (também disse que ela defendia uma causa perdida e no mês passado que é uma “criança mimada que devia ser uma “boa menina e calar-se” e voltar à escola, de onde nunca devia ter saído), há quem questione por que razão continuam a juntar-se na rua em vez de “estudar e trabalhar”, conta Gonçalo Paulo. “Para muitos isto continua a ser algo estranho, não legítimo, mas nós vamos continuar a fazer greves porque além de legítimas, são necessárias. Esperamos que haja cada vez mais jovens a juntar-se a nós e que o resto da população olhe para nós e finalmente perceba que vamos sofrer.” Quanto aos jovens, “e não podendo muitos deles ainda votar, participar nestas manifestações acaba por ser a única forma de exercer o seu poder”.

Além de Lisboa, onde a manifestação terá início às 10h00, no Largo de Camões, seguindo depois para a Assembleia da República, estão confirmadas greves no Porto, Coimbra, Faro e na ilha de Santa Maria, nos Açores. Estão ainda previstos outro tipo de ações em Penafiel, Évora e Caldas da Rainha. A greve ocorre a dias da chegada de Greta Thunberg, de veleiro, a Portugal, ponto de paragem antes da Cimeira sobre as Alterações Climáticas (COP25) de Madrid.

“Ter uma pessoa eloquente a falar não é suficiente, não muda nada.”

Segundo Gonçalo Paulo, cuja organização a que pertence tem estado em contacto com a ativista, continua sem saber-se em que dia Greta chegará a Portugal ou mesmo se irá, de facto, participar na sessão na Assembleia da República, promovida pela comissão parlamentar de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, para a qual foi convidada. Greta Thunberg viajou em Agosto do Reino Unido para Nova Iorque, a bordo de um veleiro ecológico, para participar na Cimeira das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, em setembro. Pretendia viajar de seguida para o Chile, para participar na COP25 que era suposto realizar-se ali mas foi cancelada no final de outubro por causa dos protestos contra a desigualdade social e a corrupção que se mantêm há várias semanas no país.

Embora a sua chegada a Portugal seja aguardada com alguma expectativa, ou não fosse Greta a “grande inspiração” para o movimento global pelo clima, a organização da Greve Climática Estudantil portuguesa não se ilude. “O que temos visto nas várias intervenções dela é que os políticos aceitam o seu discurso mas é unicamente isso que fazem. Nada muda verdadeiramente”. Claro que a ativista é “muito importante, mas já percebemos que ela, sozinha, não chega”. “Ter uma pessoa eloquente a falar não é suficiente, não muda nada. Precisamos mesmo de sair à rua.”

Além disso, diz, é “injusto colocar em cima da ativista o peso de todo o movimento”. “Ela é apenas uma adolescente como nós. E devemos prestar atenção a todos os jovens e não apenas àqueles que falam nas Nações Unidas.” Convém então relativizar a importância da vinda da ativista a Portugal? Não é bem isso, diz Gonçalo Paulo. “Estamos contentes que o nosso Governo tenha mostrado interesse em falar com ela, mas isso não vai mudar uma única opinião. O que ela tem dito já foi dito inúmeras vezes antes e sem qualquer influência nos governos, que teimam em não ouvir, porque é que haveria de ser diferente agora?”

Ainda assim, o movimento pelo clima em Portugal tem muito para dizer, muitos problemas para partilhar, como a “ampliação de aeroportos e a exploração de gás fóssil na zona centro do país”, apenas para referir alguns. “Ela é uma pessoa experiente, já falou com bastantes líderes e há de saber melhor que nós como fazer com que as pessoas nos ouçam.”

Mais de 2300 cidades com protestos anunciados

São esperados mais 100 mil manifestantes na Greve Climática Global desta sexta-feira, que vai decorrer em mais de 2300 cidades de 153 países, segundo estimativas do movimento Fridays for Future citadas pela agência Lusa. Nas duas últimas semanas realizaram-se manifestações em cerca de 1500 cidades de 145 países.

Comparando com os dois últimos protestos mundiais, os jovens parecem estar mais mobilizados para o protesto desta sexta-feira, ainda de acordo com a agência de notícias. O número de cidades aumenta (mais 750), assim como o número de países (mais oito).