A primeira impressão que salta à vista nesta floresta desfigurada pelo fogo é a cor. Há não muito tempo, esta parcela a sul do Parque Nacional de Yellowstone era um pedaço monocromático de cinzas e pinheiros queimados. No Verão passado, porém, raízes e plântulas de álamos e pinheiros jovens pintavam o solo de verde eléctrico. Os troncos enegrecidos ganhavam tons de púrpura dos troviscos e vermelho-sangue das bagas de seferdias. Cinco anos depois de o incêndio de Berry devorar 84 quilómetros quadrados no estado de Wyoming, esta parcela queimada reagia ao fogo da mesma forma que as florestas das montanhas Rochosas reagem há milénios: renascendo. Monica Turner tem documentado essa recuperação. Num dia escaldante de Julho, esta professora de Ecologia da Universidade de Wisconsin–Madison, movia-se à volta de uma fita métrica que esticara ao longo de 50 metros. Ela e um aluno de pós-graduação contavam cada plântula de pinheiro no espaço de um metro para cada lado da fita. Estavam tão afastados da estrada que não havia maneira de saber que habitantes da floresta poderiam estar à espreita – veados, alces ou lobos.

Havia tantos troncos minúsculos em redor dos pés dos investigadores que foi necessária quase uma hora para percorrer uma distância que normalmente demoraria segundos. No final, contaram-se 2.286 rebentos. Naquele local, estavam a nascer 172 mil pinheiros por hectare. “É típico dos pinheiros-contorta”, diz a especialista. “Recuperam velozmente.”

No dia anterior, em contrapartida, numa parcela adjacente, Turner documentara algo desconcertante. Em vez de um rio de novas plântulas de pinheiro, o solo era uma mistura de flores, ervas e terra compactada. Ao longo de um segmento de 50 metros, Monica Turner detectara apenas 16 rebentos de pinheiro e noutro apenas nove. No geral, esta secção produzia menos de 1/50 de jovens coníferas do que a sua vizinha.

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Floresta Nacional das Sequóias. Uma chuva de brasas cai da copa de uma sequóia incendiada por uma fagulha em 2021. A árvore sobreviveu. 

As duas secções de floresta eram quase idênticas. Antes do incêndio de Berry, as duas parcelas tinham ardido no século XIX, sensivelmente na mesma época da Guerra da Secessão. Havia algo que as distinguia, porém. O local com menos pinheiros também já ardera outra vez em 2000. As árvores que germinaram depois desse incêndio ainda não tinham crescido o suficiente para produzir sementes antes de serem varridas em 2016. Neste local, em vez de replantar o pinhal, o incêndio de Berry estava a refazer a paisagem, criando algo novo para os próximos séculos ou milénios.

Yellowstone faz parte de uma tendência global. Os incêndios florestais estão a tornar-se maiores, mais quentes e mais frequentes à medida que o clima muda. Em 2019 e 2020, os incêndios florestais da Austrália queimaram uma área correspondente a quase o dobro de Portugal, mas o factor frequentemente menosprezado nesta carnificina é o que acontece depois de as árvores morrerem: muitas florestas esforçam-se agora por recuperar. Aliás, isto não é válido apenas para Yellowstone e nem é sempre desencadeado pelo fogo – é uma consequência das alterações climáticas.

Em muitos lugares, as florestas já não estão a regenerar-se sozinhas. Algumas das paisagens florestais mais importantes do mundo estão em transição, transformando-se em algo novo. Outras poderão nunca recuperar.

sequóias

Floresta Nacional das Sequóias. Numa encosta queimada da Sierra Nevada (EUA), sequóias gigantes — algumas com mais de mil anos — erguem-se como adagas negras entre as árvores mortas. Embora as sequóias consigam frequentemente sobreviver a incêndios ao nível do solo, por terem poucos ramos baixos, este fogo elevou as chamas até às copas. As alterações climáticas e o combate ao fogo estão a contribuir para incêndios florestais de maiores dimensões.

A Terra perdeu um terço das suas florestas ao longo dos últimos dez mil anos e metade desse valor perdeu-se apenas desde 1900 por causa da madeira. Cortámo-las para abrir espaço para explorações agrícolas e criação de gado. Limpámos parcelas para construir casas e estradas. A nível global, a desflorestação diminuiu desde a década de 1980, mas as tendências variam de região para região. Na Indonésia, tristemente conhecida por abater florestas para criar plantações de palmeiras oleaginosas, a perda de floresta primária abrandou a partir de 2016.

Entre Agosto de 2020 e Julho de 2021, a Amazónia brasileira perdeu 13 mil quilómetros quadrados de floresta húmida, um aumento de 22% em relação ao ano anterior. Desde 1990, abatemos mais floresta no planeta inteiro do que a floresta existente nos EUA.

Agora, as emissões de combustíveis fósseis estão a transformar as florestas de forma transcendental. À medida que o dióxido de carbono e outros gases com efeito de estufa aquecem o planeta, algumas das 73 mil espécies de árvores avançam na direcção dos pólos e das montanhas mais altas, arrastando consigo outras formas de vida. Amieiros, salgueiros e bétulas estão a expandir-se no Árctico, desde a Escandinávia ao Canadá. As árvores crescem mais depressa por absorverem o CO2 em excesso – ingrediente essencial para a fotossíntese. Este “esverdeamento” do planeta tem ajudado a abrandar as alterações climáticas.

No entanto, as alterações climáticas também estão a matar árvores. E o que causa inquietação crescente aos engenheiros silvicultores é o ritmo crescente de acontecimentos extremos – incêndios, tempestades severas, infestações de insectos e, acima de tudo, secas e calor, que podem piorar os efeitos. Estes episódios singulares, frequentemente inéditos, podem provocar mortalidade em massa das árvores, alterando florestas que existem desde a última era glaciar para um estado completamente novo.

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Costa Norte Austrália. Anos de muito calor e seca colocaram sob stress mangues ao longo de centenas de quilómetros da costa do golfo de Carpentária. Depois, o episódio de El Niño de 2015-16 deu o golpe de misericórdia, ao causar uma descida temporária de 40 centímetros do nível do mar no local, secando as raízes. Esta fotografia de 2021 revela escassa recuperação. Só está verde uma espécie baixa de mangue, que sobreviveu.

“Há um conjunto de mecanismos que obrigam as florestas da Terra a crescer mais e a absorver mais CO2”, diz o biólogo William Anderegg. Mas esses mecanismos “estão, no essencial, em tensão com mecanismos que atraem as florestas do planeta para o abismo, com mais mortalidade de árvores e mais perda de carbono”.

As florestas que já se precipitaram do alto desse abismo são uma pequena fracção dos três biliões de árvores e 4.000 milhões de hectares de floresta deste planeta. As alterações climáticas ainda representam uma ameaça menor para as florestas do que o abate madeireiro e a limpeza de terras, mas essa ameaça está a crescer velozmente. “Que importância irá essa fracção assumir com o tempo e quando se sobreporá à outra dimensão?”, pergunta Matt Hansen da Universidade de Maryland, que monitoriza florestas com a ajuda de satélites.

Na verdade, ainda não conseguimos quantificar a extensão global dos impactes climáticos. Segundo dados recolhidos por satélite, a área da Terra coberta por árvores aumentou 7% entre 1982 e 2016, uma área superior à do México.

Porém, os dados não distinguem florestas naturais de plantações de árvores industriais, como os milhões de palmeiras-dendém, eucaliptos e pinheiros plantados para exploração madeireira enquanto a floresta húmida é abatida. Os dados também não mostram que florestas foram derrubadas por serras eléctricas e aquelas que foram abatidas por eventos de índole climática.

Até à data, nenhum modelo informático consegue fazer projecções da forma como o clima alterará as florestas a nível global ou se o carbono que armazenaram terá repercussões sobre o clima. “Historicamente, os modelos de sistema terrestre não têm captado a complexidade desta relação”, diz Charlie Koven, climatólogo que trabalhou com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU. Apenas dois dos seus 11 modelos incluem o fogo e as deslocações geográficas nas plantas.

O número de árvores a nível mundial não é o único indicador relevante. As alterações climáticas estão a dar novas formas às florestas a nível local, quase da noite para o dia, incluindo nos países onde existem políticas públicas de protecção. Tudo se passa a tal velocidade que nem conseguimos discernir as consequências. Embora estejamos a perder árvores de todos os tipos e tamanhos, as maiores e mais antigas são as que sequestram mais carbono, são importantes para a biodiversidade e serão as mais difíceis de recuperar. “As árvores grandes têm uma importância desproporcional e não podem ser substituídas rapidamente – se é que podem”, argumenta Nate Stephenson, cientista emérito dos Serviços Geológicos dos EUA.

Todos sofreremos com isto. Os seres humanos encontram-se ligados à floresta. A nossa história está ligada às árvores. Descemos das suas copas e usámo-las para fazer fogo. O advento do papel permitiu o florescimento da literatura e da ciência. As árvores alimentam-nos, abrigam-nos, dão-nos medicamentos. Dependemos delas de formas que mal percebemos, incluindo para descomprimir num mundo cheio de ruído.

Um dos meus refúgios preferidos é a floresta húmida Hoh, na península Olympic, a quatro horas de minha casa. Neste local, fetos cintilantes e altos cobrem o solo e espruces antigos e áceres cobertos de musgo verde-esmeralda tapam o céu. Os seres humanos começam agora também a perceber muito do que ocorre fora do seu campo de visão. As árvores de uma floresta não são indivíduos isolados: partilham nutrientes e dados entre espécies através de redes micológicas subterrâneas. conversam entre si, transmitindo mensagens químicas, avisando-se sobre invasões de pragas e outros perigos.

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Wyoming, a sul de Yellowstone. A ecologista Monica Turner conta o número de rebentos de pinheiro-contorta que estão a germinar entre os pinheiros ardidos em 2016. O fogo abre as pinhas, permitindo ao pinhal regenerar-se. No entanto, se houver outro incêndio antes de as árvores serem adultas, poderão não voltar a crescer.

As florestas primárias são colaborativas, disse Korena Mafune, bolseira de pós-doutoramento, enquanto caminhávamos recentemente em Hoh. Ela suspeita que uma versão minúscula desta rede micológica possa até existir nos ramos altos. Já encontrou terra sob o musgo que cresce nas copas, com árvores minúsculas germinando nos ramos vivos das árvores grandes e antigas – “uma minifloresta dentro de uma floresta”, resume. Ela teme que até este lugar ancestral possa mudar rapidamente se uma seca durar demasiado tempo.

O calor e a seca desencadeados pelas alterações climáticas mataram 20% das árvores da região africana do Sael, no Sudoeste de Marrocos, e na região ocidental dos EUA desde 1945, segundo o mais recente relatório do IPCC. Cinco das oito mais abundantes espécies de árvores do Oeste Americano diminuíram de forma significativa desde apenas 2000, sobretudo devido a fogos e pragas. Os pinheiros-contorta estão no topo da lista.

“Nesta época de alterações climáticas, as florestas estão mais vulneráveis do que se pensa”, diz o ecologista Craig Allen. Há duas décadas que Craig tenta alertar as pessoas para esse perigo.

Aos 62 anos Monica Turner tem a capacidade de um estudante universitário para se manter animada enquanto trabalha sem parar. Passei vários dias com ela no Verão passado, no John D. Rockefeller Jr. Memorial Parkway, uma parcela de artemísia e pinheiros maior do que Manhattan. Liga Yellowstone e os Parques Nacionais de Grand Teton.

Monica apareceu em Yellowstone em 1978 para trabalhar como vigilante da natureza durante o Verão, orientando passeios guiados pela natureza ao pôr do Sol. Com os seus prados dourados e lagoas termais caleidoscópicas, Yellowstone hipnotizou-a. Ela acabaria por regressar e passar décadas a estudar as suas árvores.

Em 1988, Monica e um colega, o ecologista Bill Romme, percorreram as terras bravias de helicóptero, em todos os sentidos, avaliando o seu estado no rescaldo da pior estação de incêndios do último século. Um terço de Yellowstone (321.270 hectares) esvaíra-se em fumo em poucos meses. Monica temia que nunca recuperasse. Durante o voo, porém, começou a acreditar naquilo que Bill lhe sugerira recentemente: era isto que, supostamente, Yellowstone deveria fazer.

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Sibéria Oriental. A neve cobre uma floresta boreal que ardeu no Verão anterior na República de Sakha. Pequenos fogos ocorrem regularmente nesta região, que tem cerca do dobro da área do Alasca. Em 2021, porém, uma área quatro vezes superior à média anual ardeu, libertando potencialmente carbono ancestral do permafrost e transformando a floresta em pradaria.

Muitas pessoas tinham partido do princípio de que os incêndios de Yellowstone aumentaram porque os bombeiros começaram a apagar os incêndios florestais há mais de um século, permitindo que se aglomerassem árvores em excesso que funcionavam como combustível.

Isto é válido para certas partes do mundo, mas, ao percorrer os trilhos dos animais selvagens para cartografar a história dos incêndios do parque, Bill descobriu que, historicamente, Yellowstone só registava fogos graves com intervalos muito longos. “Nem sequer tinham ocorrido muitos fogos históricos antes do início da era de combate a incêndios”, disse certa manhã no parque. “Foi bastante surpreendente.”

Yellowstone é uma região de pinheiros-contorta. Os seus troncos densos e esguios ocupam 80% das florestas do parque. Alguns são seratinosos, o que significa que precisam de fogo para abrir as pinhas que contêm as suas sementes.

Bill Romme demonstrara que, nos séculos XVIII e XIX, tinham ocorrido incêndios colossais nestas florestas, que eliminaram grandes manchas de árvores. Esses incêndios eram raros porque o parque era “demasiado húmido e demasiado frio”, disse. Mas a cada 100 a 300 anos, num Verão excepcionalmente quente e seco, enormes parcelas ardiam num grande incêndio, permitindo o renascimento da floresta.

As florestas, percebeu Monica Turner, eram resilientes. Mas podem deixar de sê-lo.

Em 2002, ocorreu um alerta precoce no decurso da pior seca das últimas cinco décadas no Sudoeste. Semanas antes de conhecer Monica Turner, subi atabalhoadamente um barranco empoeirado junto do Monumento Nacional de Bandelier, no estado do Novo México. A meu lado, os especialistas Craig Allen e Nate McDowell examinavam uma fotografia que Craig captara, mostrando aglomerados de pinheiros-mansos com as agulhas tingidas de cor de laranja, por estarem a morrer.

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Costa Sudeste, Brasil. Seis meses depois da morte dos mangues da Austrália, em 2015, o mesmo episódio de El Niño desencadeou uma tempestade que se abateu sobre os mangues do estuário do rio Piraquê-Mirim. A seca provocara stress hídrico nas árvores, em parte por ter aumentado a salinidade da água. O granizo e o vento mataram quase um terço delas. A nível global, as principais ameaças enfrentadas pelos mangues diminuíram, mas as alterações climáticas são uma preocupação crescente.

Craig estudava florestas nesta zona florestada árida junto das montanhas Jémez desde a década de 1980 e, agora, os pinheiros adultos da fotografia tinham desaparecido. Restava terra rachada, juníperos resistentes e uma plântula aqui e além. Na década de 1950, uma seca mais grave trouxera menos chuva e, contudo, entre 2002 e 2004, o impacte visível nas árvores era pior: em algumas áreas, mais de 90% morreram, vítimas de uma praga do escaravelho dos pinheiros, um predador natural como nunca se vira. No total, cerca de 350 milhões morreram em todo o Sudoeste dos EUA.

Incêndios sem precedentes ceifaram dezenas de milhares de hectares de pinhal.

Craig sentiu-se desconcertado face à gravidade do sucedido. Aos poucos, porém, ele e Nate perceberam que esta seca era mais quente. O ligeiro aumento da temperatura atribuível às emissões de gases com efeito de estufa era suficiente para iniciar a morte das árvores do Novo México.

E, entretanto, Craig retirou outra lição: as árvores de todo o mundo são vulneráveis ao calor acrescido. A atmosfera mais quente suga mais humidade das plantas e do solo. De modo a reduzirem as perdas durante as secas, as árvores fecham os poros das folhas, chamados estomas, ou deixam cair todas as folhas. No entanto, isso limita a sua capacidade de absorção de CO2, deixando-as simultaneamente com fome e ressequidas. Quando há mesmo muito calor, chegam a verter parte da água que estão desesperadas por reter.

Quando o solo fica extremamente seco, as árvores já não conseguem manter a pressão nas condutas internas que transportam água até às folhas. Bolhas de ar interrompem o fluxo, causando embolismos fatais. Algumas árvores protegem-se com raízes mais fundas ou armazenando mais água, mas esses “investimentos” são feitos à custa do seu crescimento em altura, que lhes permite conquistar luz e espaço às outras árvores.

A consequência, descoberta pela ciência na última década, é que muitas árvores estão a funcionar no limite dos seus sistemas hidráulicos, mesmo em condições normais. Isso significa que uma seca quente pode empurrá-las além do limite. Foi o que aconteceu em 2002 no Sudoeste: os registos contidos nos anéis das árvores mostrariam mais tarde que foi o ano mais seco do último milénio. Nenhum outro ano se aproximou desse.

árvores

Serra de Jémez, Novo México. Este pinheiro sobreviveu a 15 incêndios desde 1650, mas a maioria dos fogos foi suprimida no século XX. O combustível acumulou-se na floresta e depois chegou uma seca longa. Em 2011, um incêndio colossal devastou 117 quilómetros quadrados na primeira noite. Extinguiu-se “um ecossistema que nunca mais se verá aqui”, diz o cientista Craig Allen.

Tudo isto despertou Craig Allen para aquilo que ele considera agora uma ameaça global grave. “Ao assistir à transformação desta paisagem que estudei ao longo de toda a minha vida adulta… percebi que as alterações climáticas deixaram de ser teóricas”, disse. Começou a monitorizar eventos de mortalidade em massa noutros locais. Nas duas décadas seguintes, o calor e a seca matariam milhares de milhões de árvores, de forma directa ou indirecta – em Espanha, na Coreia do Sul, na Austrália. Na região central da Sibéria, a Rússia perdeu 800 mil hectares de abetos.

O calor crescente contribuiu para a disseminação de pragas florestais mortíferas, enfraquecendo as árvores e permitindo que escaravelhos e traças sobrevivessem aos invernos, ou se reproduzissem com mais frequência. Estas invasões eliminaram árvores nas Honduras, na Turquia e na Argélia. Na Europa Central, chegaram sob a forma de uma nova e chocante praga.

Num dia fresco do Outono passado, subi penosamente os 227 degraus do interior de um antigo ponto de vigilância da Guerra Fria, num pico de 1.315 metros de altitude situado nos arredores de Prášily, uma aldeia checa. Ofegante, acompanhei a passada de Petr Kahuda, vigilante da natureza no Parque Nacional de Šumava, e Zdeněk Patočka, cientista florestal da Universidade de Mendel. No topo, uma varanda circular proporciona panorâmicas sobre florestas ondulantes. Agora, grande parte das suas árvores estão a morrer, vítimas de ataques do escaravelho-do-abeto-europeu.

Em 2018, a Europa Central registou a sua pior seca dos últimos cinco séculos. As temperaturas de Verão subiram 3,3ºC acima da média. A morte de árvores subiu a pique e as sobreviventes enfraquecidas atraíram escaravelhos. A República Checa foi o país mais gravemente atingido. Os madeireiros apressaram-se a salvar o que podiam, mas havia tanto desespero que um homem ofereceu as suas ovelhas ao Parque Nacional de Šumava, na esperança de que o seu cheiro afastasse os insectos, contou Petr Kahuda.

Na Alemanha, 300 mil hectares de floresta morreram entre 2018 e 2020. A história agravou a crise: já quase não existem florestas autóctones na Europa Central. Os seres humanos transformaram por completo a paisagem. Originalmente dominadas por faias e carvalhos, muitas florestas foram replantadas com píceas da Noruega e pinheiros. Após a Segunda Guerra Mundial, foram abatidas muitas árvores para fornecer madeira aos Aliados e pagar-lhes indemnizações.

Embora as píceas cresçam naturalmente em zonas mais altas e frescas, os silvicultores também os plantaram em zonas baixas. Correu tudo bem durante 70 anos. Depois, diz Henrik Hartmann, especialista em florestas do Instituto Max Planck de Biogeoquímica, “as alterações climáticas tornaram desadequado este habitat”.

florestas ameaçadas

Durante algum tempo, Monica manteve a fé no ciclo de fogo e renascimento de Yellowstone. No entanto, em 2008, numa conferência realizada em Jackson Hole, foi confrontada com a possibilidade de a equação ter mudado. Um colega apresentou mapas sugerindo que, nas próximas décadas, em Yellowstone poderiam registar-se quase todos os anos temporadas de incêndios semelhantes à de 1988. Esse ano “deixaria de ser excepcional e os anos excepcionais seriam completamente incontroláveis”, recorda a investigadora.

A princípio, ela não quis acreditar. Há milhares de anos que os incêndios colossais de Yellowstone ardiam de forma errática, com intensidades diferentes, queimando algumas zonas e deixando outras ilesas. O mosaico permitia a sua recolonização rápida por animais e árvores. O próprio trabalho de Monica Turner, influenciada por aquela viagem de helicóptero em tempos idos, documentara exaustivamente esse padrão. Mas e se o sistema já não funcionasse assim?

Monica começou a investigar. Descobriu que os pinheiros crescem pouco em estações quentes e secas. Fora-lhe ensinado que os jovens pinheiros eram demasiado verdes para arder, mas encontrou-os em combustão durante incêndios explosivos. Viu zonas do parque que tinham ardido em 1988 pegarem fogo outra vez. Viu os fogos chegarem antes de as árvores jovens produzirem pinhas com sementes maduras. Alguns tornaram-se tão grandes e tão quentes que nenhuma árvore de semente sobreviveu para repovoar a floresta.

Em cinco lugares à volta de Grand Teton e de Yellowstone, Monica percebeu que as florestas recuperavam pouco ou nada. As alterações climáticas estavam a dar nova forma a algumas das paisagens mais famosas. Simulando um futuro no qual não reduzimos as emissões, ela antecipou como os seus filhos poderiam, um dia, ver alguns dos seus lugares favoritos: os pinhais poderiam transformar-se em prados.

raízes

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Monica pensara que Yellowstone era “o sítio mais resiliente do mundo”. Agora, a sua investigação mostrava as florestas a mudarem para um novo patamar. Outros cientistas estavam a chegar a conclusões semelhantes noutros lugares. Camille Stevens-Rumann, ecologista florestal da Universidade Estadual de Colorado, examinou 1.485 locais de 52 incêndios. O número de lugares ardidos que não recuperaram saltara de 19% antes de 2000 para 32% nos anos seguintes. “E quando falo em ‘não recuperar’, estou a dizer nem uma única árvore”, afirma.

Há não muito tempo, o Serviço Florestal dos EUA quase só plantava árvores quando as florestas eram abatidas, esperando que as áreas ardidas se regenerassem naturalmente. Agora, “cerca de 80% das nossas necessidades de reflorestação são motivadas por incêndios florestais catastróficos”, diz David Lytle, director florestal e de gestão do território da agência. Mais de metade das mais de 500 mil árvores que arderam recentemente em 154 florestas nacionais

não voltarão a crescer sem serem replantadas. E, mesmo assim, em dezenas de milhares de hectares, as sementes podem nem sequer germinar. Pelo mundo fora, há outros factores além da seca e dos incêndios. Após vagas de calor e secas extremas enfraquecerem os mangues em centenas de quilómetros ao longo da costa setentrional da Austrália, um episódio de El Niño em 2015-16, provavelmente agravado pelas alterações climáticas, provocou uma diminuição regional temporária no nível do mar. Mais de sete milhares de hectares de mangues morreram de sede. No Sudeste do Brasil, o mesmo episódio de El Niño fez diminuir a precipitação, colocando mangues sob stress. Então, num dia de Junho de 2016, granizo do tamanho de ameixas agrediu esta paisagem pela primeira vez desde que há registos, enquanto rajadas de vento de 100 quilómetros por hora sopravam as folhas e partiam troncos numa área de 500 hectares. Cinco anos mais tarde, visitei o local na companhia do oceanógrafo Angelo Bernardino. Navegando pelo rio, vimos terra a escorrer para a água, em redor das árvores mortas, garantindo que poucos, ou nenhuns, mangues voltarão a germinar ali.

Se existe uma espécie capaz de suportar as alterações climáticas, poderíamos imaginar que seriam as sequóias-gigantes, muitas das quais se erguem desde a era de Júlio César. Em vez disso, porém, a mudança está a acontecer a um ritmo assustador.

Em 2012, o tema de capa da edição de Dezembro da National Geographic foi o perfil de um espécime deslumbrante do Parque Nacional das Sequóias. Com 75 metros de altura, pensa-se que o Presidente, o nome dado ao gigante, tenha sido uma plântula quando existiam menos pessoas à face da Terra do que as que vivem actualmente em França. Tinha mais folhas do que o número de habitantes da China. A nossa reportagem descrevia a fabulosa resiliência das sequóias: a maneira como os taninos as tornavam, supostamente, imunes a pragas; como a sua casca grossa era quase resistente às chamas. Os investigadores mostraram-se preocupados com o futuro, mas não alarmados.

florestas

Sudoeste de Copenhaga, Dinamarca. Os benefícios palpáveis (alimento, madeira, armazenamento de carbono) não são os únicos. Está provado que visitar bosques, ou “tomar banhos de floresta” diminui o stress. Em Camp Adventure, os visitantes sobem um passadiço em espiral com 45 metros de altura para obterem uma nova perspectiva das árvores… e talvez da vida.

No Verão passado, menos de uma década mais tarde, sentei-me na copa de uma sequóia vizinha e fiquei a olhar para o Presidente. Sentia a garganta irritada devido ao fumo de um incêndio nas proximidades. Doíam-me as pernas por ter subido quase 60 metros, com a ajuda de uma corda de escalada, para me juntar ao ecologista florestal Anthony Ambrose. Vim até aqui porque, de repente, ele e outros cientistas ficaram nervosos.

Em 2014, dois verões depois da publicação daquela reportagem, as sequóias começaram a perder agulhas, uma manobra radical para reduzir a sua necessidade de água durante uma seca horrível. Depois, os cientistas viram que 33 árvores estavam a sucumbir a ataques fatais de insectos. Anthony viu túneis abertos nas cascas e ramos tentando empurrar os insectos para fora, exsudando resina. Teve receio de que outras árvores se seguissem.

Antes disso, as sequóias eram consideradas “aberrações” no mundo das coníferas porque “ninguém vira uma morta por insectos”, dissera-me Nate Stephenson na véspera do meu encontro com Anthony Ambrose. Nate sabia do que falava. Estudando estas rainhas há mais de 40 anos, compreendia-as melhor do que ninguém.

Em 2015, pouco depois da queda das agulhas e da chegada dos insectos, Nate encontrou-se com Christy Brigham, recém-nomeada directora de recursos do parque. “Acha que é muito mau?”, perguntou ela. Nate não descobriu razões para entrar em pânico.

As ameaças às sequóias representadas pela seca e pelo fogo tinham sido previstas pelos criadores de modelos climáticos, mas a maioria não esperava perigo grave nas décadas seguintes. Os Parques Nacionais de Sequóias e do Desfiladeiro de Kings eram pioneiros no ateamento de fogos prescritos para eliminar arbustos e troncos do sub-bosque de modo a evitar incêndios florestais explosivos. Agora, os parques passariam a atear ainda mais fogos controlados, decidiu Christy Brigham. Ela contratou Anthony e a ecologista florestal Wendy Baxter para ver como as sequóias estavam a lidar com o stress hídrico.

Anthony Ambrose escalara um número suficiente de sequóias para saber que elas são velhas e rijas. Vira-as atingidas por raios e depois desenvolverem novos ramos nas copas. Vira-as abrandar a sua maquinaria fotossintética em tempos secos. Uma árvore capaz de consumir três mil litros de água por dia não sobrevive milhares de anos sem aprender a “encolher-se”. Em 2021, porém, quando nos sentámos juntos a olhar para o Presidente depois da mais chocante época de incêndios de que há registo, Anthony interrogou-se sobre quanto mais estas árvores seriam capazes de suportar.

incêndio

Nos arredores de Boulder, Colorado. Um helicóptero dispersa os restos pulverizados de árvores carbonizadas, como as cinzas de cremação, sobre uma floresta ardida em 2020. A matéria orgânica ajuda a estabilizar as encostas, permitindo o enraizamento de nova vegetação e prevenindo a erosão do solo que, de outra forma, poderia causar danos nos lagos e riachos das redondezas.

Jennifer Baltzer, ecologista florestal da Universidade Wilfrid Laurier, descobriu que, em muitas secções ardidas, a espécie dominante, o abeto-negro, está a ser substituída por outras espécies como o choupo – que, em princípio, poderá absorver mais carbono do que o abeto a longo prazo e tem menos probabilidades de arder. No entanto, na região boreal, é nos solos que se encontra a maior parte do carbono e, neste momento, eles parecem muito vulneráveis.

Entretanto, nas florestas boreais da Sibéria, incêndios cada vez piores transformaram-se recentemente em monstros de vários milhões de hectares que ameaçam libertar enormes reservas de carbono ancestral contido no permafrost. Estes incêndios transformam florestas em matagais ou pradarias, que armazenam menos carbono, diz Heather Alexander da Universidade de Auburn. No entanto, a mudança para uma paisagem de cor mais clara também tem um efeito arrefecedor, porque reflecte mais luz solar do que a floresta escura, sobretudo quando coberta pela neve do Inverno. Resumindo: qual é o estado actual do clima? Heather responde: “Desconhecido.”

A selva da Amazónia apresenta uma imagem mais nítida e urgente. Produz muita da sua própria chuva, reciclando vapor de água repetidamente. O abate de árvores para implantação de ranchos ganadeiros e explorações agrícolas de soja voltou a acelerar no mandato do presidente Jair Bolsonaro, e as alterações climáticas poderão precipitar a chegada de um perigoso ponto de viragem. Secas severas em 2005, 2010 e 20152016 vitimaram milhares de milhões de árvores e ajudaram a espalhar fogos que mataram ainda mais. À medida que a floresta é abatida, queimada ou seca, a precipitação diminui numa espiral que se vai reforçando a si própria. Alguns cientistas temem que essa espiral represente uma ameaça que empurre a maior floresta húmida do mundo para uma transição que a transforme numa savana.

As sequóias precisam de fogos de baixa intensidade ao nível do solo para libertarem as sementes das pinhas e limparem a terra, para que as sementes possam enraizar. Os seus ramos altos fazem delas alvos improváveis para incêndios ao nível das copas. Em 2020, porém, essa narrativa colidiu com um clima em rápida mudança. A mesma seca que fez as sequóias perderem a folhagem matara dezenas de milhões de árvores em florestas densas nos arredores. Foi ali que começou o incêndio de Castle.

Não tardou a saltar sobre cumeeiras e infiltrou-se nas sequóias. Chamas altas incendiaram as suas copas. O calor e o vento levaram o fumo a subir acima de dez mil metros de altitude. Ramos altos caíram, deixando cair as pinhas nas chamas, incinerando gerações futuras.

Num bosque, Christy praticamente não encontrou sementes. “Não havia nada no solo além de cinzas. Nunca tínhamos visto aquilo antes. Nunca.” Cerca de 14% de todas as grandes sequóias da Sierra Nevada, o seu habitat nativo, estavam mortas ou mortalmente feridas.

Meses depois do meu encontro com Anthony Ambrose, aconteceu novo episódio. Os incêndios de Setembro de 2021 chamuscaram as cascas de sequóias e atiraram galhos pelos ares ao longo de quilómetros. As árvores estudadas por Anthony perderam água 24 horas por dia. As chamas aproximaram-se tanto do General Sherman (a maior árvore da Terra) que os bombeiros a embrulharam em material resistente às chamas.

Os incêndios de 2021 consumiram mais 3 a 5% das grandes sequóias. Até 19% destas árvores magníficas perderam-se em apenas dois anos.

A perda de florestas devido às alterações climáticas não é apenas um desgosto. Existem outras consequências para as pessoas e para os animais selvagens. O fumo dos incêndios florestais polui cada vez mais o ar de grandes cidades. Os incêndios da Austrália de 2020 mataram 33 pessoas e mil milhões de animais, incluindo 60 mil coalas. Os fogos poderão ter alargado a lista de espécies de animais em perigo do país em 14%. A perda de florestas também liberta carbono que amplifica a ameaça do clima.

Na floresta boreal grandes incêndios libertam actualmente quantidades enormes de carbono – não só das próprias árvores, mas também dos solos turfosos húmidos nos quais elas crescem.

Jennifer Baltzer, ecologista florestal da Universidade Wilfrid Laurier, descobriu que, em muitas secções ardidas, a espécie dominante, o abeto-negro, está a ser substituída por outras espécies como o choupo – que, em princípio, poderá absorver mais carbono do que o abeto a longo prazo e tem menos probabilidades de arder. No entanto, na região boreal, é nos solos que se encontra a maior parte do carbono e, neste momento, eles parecem muito vulneráveis.

Entretanto, nas florestas boreais da Sibéria, incêndios cada vez piores transformaram-se recentemente em monstros de vários milhões de hectares que ameaçam libertar enormes reservas de carbono ancestral contido no permafrost. Estes incêndios transformam florestas em matagais ou pradarias, que armazenam menos carbono, diz Heather Alexander da Universidade de Auburn. No entanto, a mudança para uma paisagem de cor mais clara também tem um efeito arrefecedor, porque reflecte mais luz solar do que a floresta escura, sobretudo quando coberta pela neve do Inverno. Resumindo: qual é o estado actual do clima? Heather responde: “Desconhecido.”

A selva da Amazónia apresenta uma imagem mais nítida e urgente. Produz muita da sua própria chuva, reciclando vapor de água repetidamente. O abate de árvores para implantação de ranchos ganadeiros e explorações agrícolas de soja voltou a acelerar no mandato do presidente Jair Bolsonaro, e as alterações climáticas poderão precipitar a chegada de um perigoso ponto de viragem. Secas severas em 2005, 2010 e 20152016 vitimaram milhares de milhões de árvores e ajudaram a espalhar fogos que mataram ainda mais. À medida que a floresta é abatida, queimada ou seca, a precipitação diminui numa espiral que se vai reforçando a si própria. Alguns cientistas temem que essa espiral represente uma ameaça que empurre a maior floresta húmida do mundo para uma transição que a transforme numa savana.

Cada região do planeta enfrenta os seus próprios desafios, mas a ameaça às florestas é geral e planetária. “Os ecossistemas florestais estão a ser empurrados até ao limite”, diz Jennifer Baltzer.

No entanto, os governos implementam cada vez mais planos sofisticados de negócio que permitem às empresas compensar as suas emissões de combustíveis fósseis protegendo as florestas, em vez de reduzirem as emissões das suas chaminés. Frequentemente, estes esquemas não representam adequadamente a possibilidade de essas florestas não poderem ser protegidas. Enquanto eu visitava as sequóias no ano passado, um incêndio florestal no Oregon libertava o carbono que a gigante tecnológica Microsoft comprara para compensar as suas próprias emissões.

Ninguém sabe o que nos espera neste Verão, nem no próximo. Mas chegou a altura de aceitarmos a nossa nova realidade. Já não podemos impedir alterações rápidas em algumas florestas. O planeta não vai parar de aquecer até travarmos completamente as emissões de combustíveis fósseis e isso vai demorar décadas. Algumas mudanças serão drásticas.

florestas ameaçadas

Parque Nacional da Grande  Bacia, Nevada. A luz do luar banha de prata os “esqueletos” de pinheiros queimados por um incêndio excepcionalmente intenso há 21 anos. Alguns pinheiros têm cerca de cinco mil anos, sendo os organismos individuais vivos mais antigos da Terra. Plântulas germinaram entre os mortos, dando esperança de que esta espécie talvez seja uma das mais bem equipadas para resistir ao aquecimento climático.

Podemos, no entanto, impedir que a situação se agrave. Para começar, temos de travar a destruição de florestas autóctones, sobretudo tropicais, boreais e temperadas de crescimento antigo. Os benefícios que elas oferecem são insubstituíveis. Por enquanto, muitas ainda estão saudáveis.

Os seres humanos abateram muito menos árvores na floresta húmida do Congo, a segunda maior do mundo, do que nas florestas tropicais da Ásia ou da América do Sul. A floresta está a receber menos chuva. Embora algumas árvores no Gabão produzam menos fruta, fornecendo menos alimento aos elefantes da floresta, o Congo tem evitado a mortalidade generalizada de árvores. Até no Brasil e no Sudeste Asiático, milhões de quilómetros quadrados de floresta luxuriante permanecem intactos.

“Temos de proteger as florestas que temos”, diz Robin Chazdon, especialista da Universidade de Connecticut. “Essa é a primeira prioridade.”

Também precisamos de melhor gestão florestal, sobretudo no que diz respeito ao fogo. Nos meses mais frescos e secos na Terra de Arnhem, no Norte da Austrália, vigilantes da natureza indígenas usam tochas de pinga-lume ou lançam acendalhas de helicópteros para atear fogos rasteiros na erva alta. Até à data, isso reduziu dramaticamente os incêndios florestais explosivos do final do Verão.

Precisamos igualmente de recuperar florestas danificadas, sobretudo nas regiões equatoriais, onde as árvores nativas conseguem voltar depressa, mas também noutros locais. Nos EUA, uma nova lei aprovou o investimento de milhares de milhões de euros no aumento do número de viveiros e na sua capacidade para cultivar sementes e dar início à maior campanha de reflorestação da história do país, replantando 1,6 milhões de hectares numa década. E, claro, precisamos de nos libertar rapidamente da nossa dependência em combustíveis fósseis.

No meu último dia em Yellowstone com Monica Turner, visitámos locais que tinham ardido noutro incêndio de 2016. O incêndio recente queimara de tal maneira a paisagem que até incinerou troncos derrubados, nada deixando além de linhas de cinza branca que se estendiam como sombras no solo enegrecido. Turner chamou-lhes “troncos-fantasma”. Em 30 anos de deambulações entre cicatrizes de incêndios, ela nunca vira um solo tão castigado pelo fogo.

Queremos que isto continue a acontecer?

Esta Primavera, assinalam-se 150 anos desde que o presidente dos EUA, Ulysses S. Grant, assinou a lei que criou Yellowstone, o primeiro parque nacional dos EUA. Foi necessária “preservação contra danos ou pilhagem” e “conservação no seu estado natural” das maravilhas do parque. O esforço que isso representa aumentou neste século e meio. Segundo as previsões de Monica Turner, se as temperaturas globais subirem 4ºC acima dos valores pré-industriais, as píceas de altitude e os abetos subalpinos da região, como os que existem junto da nascente do rio Snake, poderão desaparecer. O coberto florestal poderá diminuir para metade até 2100. A densidade daquilo que resta diminuiria ainda mais.

Este cenário não é inevitável. Se os governos cumprirem as suas promessas actuais, o planeta aquecerá menos de 3ºC face a esse registo. A estabilização das emissões mais perto de 2ºC, ou menos, poderá limitar a perda de floresta em Yellowstone em 15%. As árvores de grande altitude ainda teriam dificuldades e haveria mais pseudotsugas e choupos, mas algumas árvores de crescimento antigo conseguiriam persistir. As florestas de Yellowstone, à semelhança de muitas no mundo, nunca mais serão as mesmas. Mas podem ficar parecidas.